Plagiando Manuel Bandeira
em a “Viagem Definitiva”
Um dia, não sei quando
ir-me-ei embora.
Outros ficarão.
E ficarão as aves cantando,
e as árvores verdejando,
e ficarão os jardins florindo,
os riachos correndo
e as fontes gotejando,
e as crianças sorrindo.
Até quando?
Um dia igual a outro dia.
As tardes ensolaradas
e as imensas noites estreladas.
O céu azul,
o mar imenso,
o infinito…
E ouvir-se-ão bem longe
os sinos do campanário.
E morrerão os que amei
e os que me amaram.
Os que detestei e me detestaram
e aqueles a quem muito simplesmente
não liguei,
e que por sua vez não me ligaram.
Mas novos seres surgirão
na minha aldeia.
E sempre as casas cheias
e sempre um dia como outro dia.
O meu corpo e o meu espírito
vagueiam neste momento
no pequeno jardim
de uma casa velha.
As heras formando sebe
enroscadas numa rede.
As rosa abrindo,
a um lado um cacto gordo, espinhoso,
e no canto oposto uma magnólia
abrindo as folha a medo.
O verde-branco do arbusto ao centro
e um poço redondo
caiado de branco.
Por cima um canteiro
com amores-perfeitos.
Em baixo as sécias, os jasmins,
os gladíolos.
Ao lado um vaso com craveiros
velhos secos e amarelos.
Atrás, verde e viçoso
um pé de glicínias.
E com um olhar nostálgico, penso:
que deixarei este sítio
que não é de sonho,
mas de realidade.
E ir-me-ei embora.
Para outro lugar
para uma cova funda,
sem luar
sem árvores
sem verde
sem céu azul
sem mar
sem jardins
sem canteiros, mas com flores
e sem água correndo.
Mas as aves permanecerão
cantando…
e as crianças sorrindo…
Até quando?
Rio da Fonte, 27 de Agosto de 1974
Um belo poema! Quando chegar a minha vez espero que os que ficarem, cada vez que olharem para uma bela rosa orvalhada, se lembrem de mim.
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